quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Por um serviço mais simpático na França
Paris ‒ Em uma tarde tranquila, perto da Place de la Bastille, Alberto Ribeiro, turista espanhol, parou com a família em um café pitoresco com a família e perguntou ao garçom onde poderiam se sentar. "Olhe à sua volta!", disse ele, abruptamente.

Paris ‒ Em uma tarde tranquila, perto da Place de la Bastille, Alberto Ribeiro, turista espanhol, parou com a família em um café pitoresco com a família e perguntou ao garçom onde poderiam se sentar. 'Olhe à sua volta!', disse ele, abruptamente. 'Não está vendo quantas mesas vazias?'
Quando o grupo tentou fazer os pedidos em um francês hesitante, o homem revirou os olhos; mais tarde, quando os pratos chegaram e um deles estava errado, quase saiu briga para que fosse devolvido.
'Em geral os franceses são bem simpáticos e solícitos', diz Ribeiro, que, no fim, teve uma estadia agradável. O incidente, porém, 'foi um lembrete de que eles também podem ser bem grosseiros'.
Na Cidade Luz, a eterna questão parece ter voltado à baila: o estereótipo do francês ríspido é justificado ou são os turistas que não o compreendem?
E o questionamento saiu de um local improvável: a Secretaria de Turismo de Paris, que está criando uma ofensiva cheia de charme para melhorar a imagem dos franceses ‒ principalmente a dos parisienses ‒ e convencer os turistas de que serão bem tratados. O resultado é que as autoridades estão afogando cafés, hotéis, lojas e pontos de táxi com vinte mil panfletos intitulados 'Você fala a língua do turista?', manual que ensina como receber bem os visitantes; em julho, 35 mil cópias foram distribuídas.
Através dele, ficamos sabendo que os britânicos gostam de ser chamados pelo primeiro nome, que os japoneses gostam de se sentir seguros e os espanhóis só querem um pouco de simpatia ('Eu concordo', confirma Ribeiro). Já os norte-americanos não largam seus objetos pessoais e gostam de jantar às seis da tarde ‒ o que é impensável para o parisiense da gema.
'O objetivo é combater a má fama e melhorar a qualidade da recepção em Paris', explica François Navarro, diretor de comunicações do Comité Régional du Tourisme Paris Île-de-France. Com trinta milhões de turistas por ano, a capital é uma das cidades mais visitadas do mundo. 'Podemos oferecer muito mais.'
Quanto, só o tempo dirá. Paul Kappe, dono da famosa Brasserie de l'Isle Saint-Louis, que fica atrás da Catedral de Notre-Dame, deu de ombros quando viu o manual.
'Já começa dizendo que os franceses são desagradáveis', diz ele, de olho no trabalho dos garçons no terraço ensolarado, em meio às mesas pequenas. 'Além de não ser verdade, ainda não impede ninguém de ser desagradável.'
E acrescenta: 'Muitos deles veem essa abordagem como incômodo durante o expediente.'
A campanha ganha nova importância porque a França tenta se recuperar da crise econômica que aguçou ainda mais o desânimo no país. Em agosto, a federação francesa de hotéis e restaurantes registrou uma queda de dez por cento no turismo comparado aos números de um ano atrás.
Talvez mais complicada seja a concorrência que a cidade enfrenta, não só de rivais como Londres, Nova York e Barcelona, mas também de metrópoles que começam a despontar na região da Ásia-Pacífico. Em 2012, mais de vinte por cento dos turistas do mundo inteiro visitaram pelo menos uma localidade asiática; a região faturou US$324 bilhões ‒ trinta por cento do total mundial, segundo relatório da ONU. Já os EUA faturaram US$126 bilhões no setor, enquanto a França registrou US$54 bilhões, menos que a China e a Espanha.
'Há uma disputa econômica acirrada entre as capitais mundiais do turismo no momento', conta Navarro. 'Há quinze anos, havia cerca de 60 destinos de maior destaque; hoje, são mais de 600. Quem não melhorar os serviços vai perder dinheiro.'
Entretanto, será que todo esse esforço é mesmo necessário? Afinal, inúmeros visitantes deixam a capital francesa encantados, sem nunca ter tido problemas com serviços ruins.
'Não me lembro de jamais ter sido maltratado', afirma Paul Sanger, de 74 anos, norte-americano natural de Atlanta que garante ter visitado Paris mais de cem vezes ao longo de 50 anos. 'O que muita gente acha que é má educação é simplesmente falta de conhecimento; tem muito a ver com a cultura.'
Para muitos estrangeiros, nunca foi tão fácil explorar Paris: atualmente, um verdadeiro batalhão de garçons alterna o inglês com a língua nativa com facilidade e até orgulho, sem contar as 600 mil pessoas que trabalham no setor e consideram a educação como fator essencial.
Ainda assim, o esnobismo não é coisa do passado ‒ e os próprios franceses reclamam da falta de delicadeza de alguns de seus compatriotas. Há alguns anos, o jornal Le Parisien lançou uma sequência de comerciais de TV que mostrava os parisienses furando fila e levando o cachorro para passear sem recolher suas fezes, o que provocou risadas. Aliás, não é a primeira vez que o governo procura encorajar uma melhora na imagem: em 1995, a campanha 'Bonjour' pedia à população simpatia com os turistas, repetindo outras iniciativas semelhantes desde a Segunda Guerra Mundial.
É claro que muitos turistas também podem ser bem desagradáveis. 'Há norte-americanos que gritam, não se dão nem ao trabalho de cumprimentar ninguém e depois reclamam de falta de educação', desabafa Karen Fawcett, presidente do BonjourParis, um site que reúne informações culturais e turísticas. 'Se a pessoa não tiver bom senso em termos culturais, não vai ser bem-recebida em lugar nenhum.'
Fawcett aconselha os visitantes a serem gentis, falarem baixo e não acharem que vão ser atendidos imediatamente. 'Um simples 'bonjour’ ou 's'il vous plaît' também fazem verdadeiros milagres', completa.
Kappe, da Brasserie de l'Isle Saint-Louis, disse que seus garçons gostam de papear com os clientes, mas recusam a recomendação do panfleto que pede que se use o primeiro nome. 'Isso não se faz', resume.
Todos os profissionais do estabelecimento são experientes e sempre impecavelmente vestidos, com camisa branca e avental preto. O sorriso, longe de ser caloroso, é profissional, mas servem o vinho com maestria e sugerem o 'plat du jour' para entabular uma rápida conversa; por outro lado, alguns ignoram solenemente os clientes que têm pressa na hora de pedir a conta.
'Nos EUA, os garçons podem ser demitidos a qualquer hora e trabalham pela gorjeta, então precisam ser simpáticos. Na França, só são demitidos se não estiverem trabalhando direito, mas se eu pudesse escolher, todos seriam mais camaradas', conclui Kappe.
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