Advogado de Assange acusa ex papa de ser conivente com pedofilia
da Livraria da Folha
O advogado britânico Geoffrey Robertson, que assumiu a defesa de Julian Assange em 2010, acusa o papa Bento 16 e o Vaticano de serem tolerantes com casos de pedofilia e de outros abusos sexuais cometidos por membros da Igreja em todo o mundo.
No livro "O Papa É Culpado?", Robertson revira o histórico de denúncias contra o clero e mostra que a prática não é nova. Atualmente, o autor defende que ao menos 9% dos sacerdotes católicos estão envolvidos com algum tipo de crime sexual.
Segundo o autor, esconder que paroquianos são molestados é assegurado pelo direito canônico, código que rege as punições para os sacerdotes. Com isso, os acusados são transferidos e, seus pecados, perdoados.
O sistema que permite tal impunidade é administrado pela Congregação para a Doutrina da Fé, comandada por Joseph Ratzinger durante quase 25 anos. Essa "imunidade legal" torna possível acobertar crimes e deixa o acusado livre para reincidir em outra localidade.
Robertson também questiona como uma instituição com acusações desse gênero pode debater controle de natalidade ou direitos das mulheres e dos homossexuais.
Abaixo, leia um trecho de "O Papa É Culpado?".
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PREFÁCIO Divulgação |
Autor usa rigor moral e precisão jurídica para questionar a Igreja |
Escrevi um breve comentário para o Guardian e o Daily Beast na Páscoa de 2010, quando era esperado que o papa Bento XVI comentasse (embora não o tenha feito) a crise em sua Igreja causada pelas revelações no mundo todo de abusos sexuais cometidos por padres. Argumentei que os casos de estupro e assédio sexual perpetrados contra crianças de forma ampla e sistemática poderiam ser configurados como crimes contra a humanidade, e que o líder de qualquer organização que proteja seus membros criminosos da justiça poderia ser responsabilizado em um júri internacional. Expliquei também que a tese de inimputabilidade do papa por ser um chefe de Estado - da Santa Sé, no caso (uma ideia usada recentemente em sua defesa pelo governo Bush em tribunais dos Estados Unidos) - estava aberta a sérios questionamentos, uma vez que tem como base o precário acordo feito com Mussolini em 1929, o que não se compara à soberania das nações independentes. A Organização das Nações Unidas (ONU) errou ao garantir à Igreja Católica um status privilegiado que não é concedido a nenhuma outra religião ou ONG.
Minhas palavras sem dúvida alguma passariam despercebidas caso um ousado subeditor não tivesse decidido publicá-las sob a manchete "Colocando o papa na mira", uma ideia corajosa que transformou imediatamente o artigo em notícia internacional. Em seguida, Christopher Hitchens, um velho amigo que havia despertado meu interesse pelo assunto, e também Richard Dawkins e Sam Harris foram envolvidos por terem me apoiado no que se tornou uma absurda capa de tabloide com a manchete "Esquema planeja prender o papa". Isso fez com que o meu argumento inicial se perdesse em meio à comoção. O importante era deixar claro que os papas não são imunes a ações legais e que, a menos que o Vaticano desista de proteger padres pedófilos e abandone a exigência de julgá-los pelo direito canônico, seu líder poderia muito bem ser processado ou investigado pelo promotor de um júri internacional.
O fato é que dezenas de milhares de crianças no mundo todo foram abusadas sexualmente por padres que em sua maioria foram julgados em sigilo por um código de leis eclesiástico que não garante nenhuma punição verdadeira e dá a esses transgressores ampla oportunidade de reincidência. O mais impressionante é que isso não foi reconhecido como uma atrocidade contra os direitos humanos pelo ineficiente comitê da ONU responsável por supervisionar a Convenção dos Direitos da Criança, ou por países como os Estados Unidos e o Reino Unido, que preparam relatórios denunciando graves violações dos direitos humanos, ou até mesmo por organizações como a Anistia Internacional e a Human Rights Watch. Em parte, isso pode ser resultado de um bom trabalho feito por vários católicos e organizações católicas de ajuda humanitária, como a Caritas e a CAFOD, grupos que admiro muito e apoio desde a fundação. Mas também é uma consequência da equivocada postura de reconhecer essa organização religiosa como um Estado, dotado de poderosas conexões diplomáticas com governos do mundo todo e de um comandante beatífico que é procurado por líderes políticos que fazem peregrinações para serem abençoados. A ideia de que esse representante da paz e dos princípios morais poderia fechar os olhos para um crime internacional desafia as próprias crenças dessa religião.
Mas não há dúvida de que a escala desse escândalo só foi alcançada graças às diretivas do Vaticano, especialmente da Congregação para a Doutrina da Fé (CDF), por exigirem que todas as denúncias de abusos sexuais fossem processadas em sigilo absoluto sem nunca serem reveladas à polícia ou a advogados locais, sempre sob um código canônico obsoleto, ineficiente e não punitivo. A Santa Sé defende seu direito de operar esse sistema como um de seus privilégios de Estado, além do direito exclusivo de se pronunciar e organizar lobbies na ONU para promover sua pauta teológica: condenar o homossexualismo por ser "perverso", assim como o divórcio; negar às mulheres o direito à escolha, até mesmo para evitar uma gravidez em caso de estupro ou incesto; julgar a fertilização in vitro como um pecado por começar com uma masturbação; e não incentivaro uso de preservativos em caso algum, nem mesmo para evitar a AIDS entre parceiros casados. O poder político associado à condição de Estado vem se mostrando muito sedutor para um papa como o cardeal Joseph Ratzinger, que foi diretor da CDF de 1981 a 2005 e que durante seu comando testemunhou uma imensa quantidade de casos de abuso sexual. O quanto ele sabia sobre o assunto e como os transgressores eram transferidos entre paróquias e até para outros países enquanto eram escondidos da justiça local não ficará claro até que a CDF seja obrigada a abrir seus arquivos, muito embora já exista uma quantidade suficiente de provas para transformar a responsabilidade moral de Joseph Ratzinger - e de João Paulo II - em alvo de um acalorado debate. Sua responsabilização legal é um tema controverso devido à tese de imunidade soberana, mas seria interessante nos perguntarmos, em um momento em que Bento XVI vem se mostrando contra uma reforma essencial da Igreja, se o papa deveria mesmo continuar sendo o único homem do mundo acima da lei.
Agradeço, como sempre, ao meu amigo Mark Stephens pelo seu apoio e a Jen Robinson pelo incrível trabalho de pesquisa e pelas excelentes ideias. Agradeço também a Matthew Albert, Lionel Nichols, Stephen Powles e Angela Giannotti pelo material complementar, e à minha assistente Judy Rollinson. Também sou grato a Tina Brown pelo apoio e a Caroline Michel, minha agente, que me inspirou a escrever o livro. E a Stefan McGrath e Will Goodlad, da editora Penguin, que prepararam a publicação em tempo recorde e aceitaram manter os parágrafos numerados, que é como eu, por ser advogado, acho que devo escrever. É uma grande honra, no 75º aniversário da Penguin, ser publicado como um Penguin Special - o primeiro desde 1989. Por fim, obrigado à minha esposa, Kathy Lette, que um dia já foi católica.
Doughty Street Chambers, 9 de agosto de 2010
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"O Papa É Culpado?"Autor: Geoffrey Robertson
Editora: L&PM
Páginas: 276
Quanto: R$ 36,90 (preço promocional*)
Onde comprar: Pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha
Atenção: Preço válido por tempo limitado ou enquanto durarem os estoques. Não cumulativo com outras promoções da Livraria da Folha. Em caso de alteração, prevalece o valor apresentado na página do produto.
Texto baseado em informações fornecidas pela editora/distribuidora da obra.
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