Farsa Reveladora
Artigo no Alerta
Total – www.alertatotal.net
Por Merval Pereira
Se juntarmos as
pressões bem sucedidas sobre o Tribunal de Contas da União (TCU) para retirar o
Conselho de Administração da Petrobras do rol dos culpados pelo prejuízo
causado pela compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, à denúncia de
que o depoimento de ex-diretores da estatal na CPMI do Congresso não passou de
uma farsa, já que eles tiveram acesso antecipado às perguntas, e foram
treinados sobre qual resposta dar, temos mais um grande escândalo envolvendo o
Palácio do Planalto e, pelo menos indiretamente, a própria presidente Dilma
Rousseff.
Ela foi a principal
beneficiária da decisão do TCU de não incluir o Conselho na relação dos
culpados, pois o presidia à época em que a compra da refinaria foi aprovada. O
próprio ex-presidente Lula entrou no circuito, pressionando seu ex-ministro
José Mucio, e o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo acompanhou o
Advogado-Geral da União Luiz Inácio Adams a uma audiência com o presidente do
TCU para tentar adiar a decisão.
Os demais diretores
da Petrobrás tiveram seus bens bloqueados e responderão a um processo,
inclusive a atual presidente Graça Foster, excluída da lista inicial por um
engano do TCU que será sanado ainda esta semana. A reação de vários deles foi
de denunciar a responsabilidade de Dilma e de todo o Conselho na compra, o que
parecem dispostos a repetir na investigação do Tribunal de Contas.
Não é à toa,
portanto, que o ex-presidente José Sérgio Gabrielli e o ex-diretor Nestor
Cerveró, acusado por Dilma de ser o responsável por um relatório falho que
teria levado o Conselho a tomar uma decisão errada, foram tratados a pão de ló
pelos assessores governamentais e líderes do PT, que trataram de lhes preparar
não apenas as perguntas, mas também as respostas, para que os depoimentos na
CPI da Petrobras tivessem aparência de coerência.
A denúncia da
revista Veja, com base em uma gravação clandestina feita por alguém presente em
uma reunião onde o assunto foi tratado em Brasília, mostra que o próprio
relator da CPI no Senado, o petista José Pimentel, usou a presidente da
Petrobras Graça Foster, e o diretor da estatal e seu ex-presidente, José
Eduardo Dutra, para passar para os ex-diretores que iriam depor as perguntas
que seriam feitas.
Na reunião gravada
aparecem o chefe do escritório da Petrobras em Brasília, José Eduardo Sobral
Barrocas, o chefe do departamento jurídico do escritório, Leonan Calderaro
Filho, e um advogado da estatal, Bruno Ferreira conversando sobre a melhor
estratégia para encaminhar as perguntas.
Segundo Barrocas,
as perguntas teriam sido formuladas pelo assessor especial da Secretaria de
Relações Institucionais da Presidência da República Paulo Argenta; pelo
assessor Marcos Rogério de Souza, da liderança do governo no Senado; e Carlos
Hetzel, assessor da liderança do PT na Casa. A participação do assessor da
Secretaria de Relações Institucionais da Presidência leva para o Palácio do
Planalto o escândalo, onde trabalha seu chefe, o deputado Ricardo Berzoini, o
mesmo envolvido na eleição de 2006 no escândalo dos aloprados.
De acordo com
declarações dos participantes da reunião, o senador petista Delcídio Amaral,
que já foi diretor da Petrobras e é apontado como próximo a Cerveró, foi o
intermediário para que chegassem a ele o que chamam cinicamente de “gabarito”,
isto é, as perguntas e as respostas certas, como se tivessem conseguido
antecipadamente o resultado certo de um vestibular.
Era “pule de dez”,
como se diz no Jóquei quando um cavalo favorito vence o páreo, que a CPI sobre
a Petrobras seria uma enganação, pois o governo, tendo a maioria, a
controlaria. Mas o que não se sabia é que o caso é tão perigoso para o governo
que seria necessário armar uma farsa mais ampla que a pura negligência na
apuração.
Pela reação dos
ex-diretores da Petrobras acusados pelo TCU, enquanto tudo não for resolvido da
melhor maneira para eles, pairará sobre o Palácio do Planalto a ameaça de
revelações que até agora foram contidas por movimentos radicais como a farsa da
CPI. O ex-presidente Gabrielli, que já dissera que a presidente Dilma não pode
fugir “de suas responsabilidades”, está calado, mas outros diretores anunciaram
que não aceitarão a culpa sozinhos.
A ousada manobra
para ajudá-los na CPI do Congresso dá bem a mostra do poder de fogo que têm. E
dizem que a construção da refinaria Abreu e Lima é muito mais problemática do
que a compra da refinaria de Pasadena...
Merval Pereira é Jornalista, membros das Academias Brasileira de Letras e Brasileira de Filosofia. Originalmente publicado em O Globo em 5 de agosto de 2014.
link:
http://www.alertatotal.net/2014/08/farsa-reveladora.html
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